quarta-feira, 19 de março de 2008

Dia do Pai

(imagem retirada de http://troll-urbano.weblog.com.pt/arquivo/pai%20e%20filho.jpg)

« Descansa, pai, dorme pequenino, que levo o teu nome e as tuas certezas e os teus sonhos no espaço dos meus. Descansa, não vou deixar que te aconteça mal. Não se aflija, pai. Sou forte nesta terra dos meus pés. Sou capaz e vou trabalhar e vou trazer de novo aqui o mundo que foi nosso. Vou mesmo, pai. o mundo solar. Reconhecê-lo-ei, porque não o esqueci. E também o tempo será de novo,e também a vida. Sem ti e sempre contigo. A tua voz a dizer orienta-te, rapaz. Não se apoquente, pai. Eu oriento-me. Pai, não se preocupe comigo. Eu oriento-me. E vou. anoitece a estrada no que sobra da manhã. Chove sol luz onde está o que os meus olhos vêem. A carrinha grande que prometeste, que planeaste para nós, que ganhaste a trabalhar meses leva-me.Onde estás, pai, que me deixaste só a gritar onde estás? Na angústia, preciso de te ouvir, preciso que me estendas a mão. E nunca mais nunca mais. Pai. Dorme, pequenino, que foste tanto. E espeta-se-me no peito nunca mais te poder ouvir ver tocar. Pai, onde estiveres, dorme agora. Menino. Eras um pouco muito de mim. Descansa, pai. Ficou o teu sorriso no que não esqueço, ficaste todo em mim. Pai. Nunca esquecerei.»

in Morreste-me de José Luís Peixoto
(Morreste-me é um livro escrito em memória do seu pai, José João Serrano Peixoto)

JOSÉ LUÍS PEIXOTO
José Luís Peixoto nasceu em 1974 (Galveias, Ponte de Sor). Licenciado em Línguas e Literaturas Modernas (Inglês e Alemão) pela Universidade Nova de Lisboa. Tem publicado poesia e prosa. Recebeu o Prémio Jovens Criadores (área de literatura) nos anos 97, 98 e 2000. Em 2001, o seu romance «Nenhum Olhar» recebeu o Prémio Literário José Saramago. Está representado em diversas antologias de prosa e de poesia nacionais e estrangeiras. É colaborador de diversas publicações nacionais e estrangeiras. Em 2005, escreveu as peças de teatro «Anathema» (estreada no Theatre de la Bastille, Paris) e «À Manhã» (estreado no Teatro São Luiz, Lisboa).

OBRAS PUBLICADAS:
  • Morreste-me (ficção, 2000)
  • Nenhum olhar (romance, 2000)
  • A Criança em Ruínas (poesia, 2001)
  • Uma Casa na Escuridão (romance, 2002)
  • A Casa, a Escuridão (poesia, 2002)
  • Antídoto (ficção, 2003)
  • Cemitério de Pianos (romance, 2006)
Veja mais sobre este autor em http://www.joseluispeixoto.net



José Luís Peixoto na apresentação do seu livro "Cemitério de Pianos", na FNAC.

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